Alvo de uma caçada judicial, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi acusado pelo delegado Marlon Cajado, da Polícia Federal, por obstruir a Justiça, com sua nomeação para a Casa Civil, que foi barrada por uma liminar do ministro do STF Gilmar Mendes em março do ano passado.

Para quem não se lembra, a presidente eleita Dilma Rousseff decidiu nomear Lula para a Casa Civil, mas áudios de suas conversas com o ex-presidente foram vazadas para o Jornal Nacional e a nomeação foi barrada por uma liminar de Gilmar.

A conclusão do delegado, no entanto, cria uma saia justa para a procuradoria-geral da República e para o Supremo Tribunal Federal, uma vez que, na segunda-feira, o decano Celso de Mello garantiu a posse de Moreira Franco como ministro de Michel Temer e afirmou categoricamente que foro privilegiado não significa obstrução judicial.

Mello disse que qualquer ministro pode ser alvo de persecução penal na suprema corte. Portanto, se todos são iguais perante a lei, e se Lula tem os mesmos direitos de Moreira Franco, a decisão monocrática de Gilmar terá que ser revista pelo plenário do STF – ou, em outra hipótese, cairá a decisão do decano.

Curiosamente Lula é acusado – não houve indiciamento formal – por um ato não dele, mas da presidente eleita Dilma Rousseff. Afinal, Lula não foi o sujeito, mas o objeto da nomeação para a Casa Civil. No relatório de 47 páginas enviado pelo delegado da PF ao ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, Dilma também é acusada de obstruir a Justiça, e o ministro Aloizio Mercadante, além de obstrução à Justiça, pelo crime de tráfico de influência.

Em nota, a defesa de Lula diz ser “desprovida de qualquer fundamento jurídico e incompatível com a decisão proferida” pelo ministro do STF Celso de Mello “a conclusão apresentada pelo delegado federal Marlon Oliveira Cajado dos Santos afirmando, conforme notícias já veiculadas pela mídia”, ‘haver suficientes indícios de materialidade e autoria’ da prática do crime de obstrução à Justiça em relação ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em virtude de sua nomeação para o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil da Presidência da República no dia 16/03/2016″.

O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, lembra que o delegado recorreu à “mídia especializada em política”, segundo ele próprio, “mas deixou de apresentar qualquer fundamento jurídico para sua manifestação”. Ainda segundo a defesa, “agente policial pretende transformar em crime um ato de nomeação que cabia privativamente à então Presidente da República Dilma Rousseff”. Leia a íntegra:

Nota

É desprovida de qualquer fundamento jurídico e incompatível com a decisão proferida no último dia 14/02/2017 pelo Decano da Supremo Tribunal Federal, o Ministro Celso de Mello, nos autos do Mandado de Segurança nº 34.690/DF, a conclusão apresentada pelo Delegado Federal Marlon Oliveira Cajado dos Santos nos autos do Inquérito Policial nº 4.243, que também tramita perante o STF — afirmando, conforme notícias já veiculadas pela mídia, “haver suficientes indícios de materialidade e autoria” da prática do crime de obstrução à Justiça (Lei nº 12.850/2013, art. 2º, §1º) em relação ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em virtude de sua nomeação para o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil da Presidência da República no dia 16/03/2016.

Celso de Mello foi claro em sua decisão ao afirmar que “a investidura de qualquer pessoa no cargo de Ministro de Estado não representa obstáculo algum a atos de persecução penal que contra ela venham eventualmente a ser promovidos perante o seu juiz natural, que, por efeito do que determina a própria Constituição (CF, art. 102, I, alínea “c”), é o Supremo Tribunal Federal”.

Esse entendimento, no entanto, não vale para Lula. No dia 20/03/2016, o ex-Presidente foi impedido de exercer o cargo de Ministro de Estado a despeito de preencher todos os requisitos previstos no artigo 87 da Constituição Federal. O impedimento foi imposto por liminar deferida pelo Ministro Gilmar Mendes, que mudou seu posicionamento de longa data sobre a ilegitimidade de partidos políticos para impugnar esse tipo de ato e acolheu pedidos formulados pelo PSDB e pelo PPS.

Agora um agente policial pretende transformar em crime um ato de nomeação que cabia privativamente à então Presidente da República Dilma Rousseff. Para chegar a tal conclusão, o agente público recorreu à “mídia especializada em política”, mas deixou de apresentar qualquer fundamento jurídico para sua manifestação.

Registra-se que carece de fundamento igualmente a outra acusação contra Lula de obstrução à Justiça, aquela relativa à suposta compra do silêncio de Nestor Cerveró. Os depoimentos colhidos nessa ação têm exposto a fragilidade da tese, principalmente considerando que o próprio Cerveró desmentiu qualquer ação do ex-Presidente no sentido de retardar sua delação.

O ato do Delegado Federal Marlon Cajado se soma a diversas outras iniciativas de agentes públicos que perseguem Lula por meio do uso indevido da lei e dos procedimentos jurídicos, prática internacionalmente conhecida como “lawfare”.

Esperamos que o STF rejeite a proposta do citado agente policial e aplique em relação a Lula o mesmo entendimento que é destinado aos demais jurisdicionados.​

Cristiano Zanin Martins

 

 

 

 

Fontes: brasil247 + REDAÇÃO